sábado, 25 de março de 2017

Quaresma IV domingo


«Eu fui, lavei-me e comecei a ver» (Jo 9,1-41)
















Chamados à luz da alegria

Uma carícia de luz na escuridão. Jesus toca e ilumina os olhos de um mendigo que nos representa a todos. 

Uma carícia de luz que se torna carícia de liberdade. Quem não vê tem de apoiar-se noutros, em paredes, num bastão, nos pais, nos fariseus. Quem vê caminha seguro, sem depender dos outros, livre. Como o cego do Evangelho, que curado se torna forte, deixa de ter medo, enfrenta os sábios, centra-se nos factos concretos e não nas palavras. Alimenta-se da luz e ousa. Livre. 

Uma carícia de liberdade que se torna carícia de alegria. Por ver é apreciar os rostos, a beleza, as cores. A luz é um golpe de alegria que pousa sobre as coisas. Assim a fé, que é visão nova das coisas, cria um olhar luminoso que leva a luz onde pousa: «Vós sois luz no Senhor» (Efésios 5, 8). 

Os fariseus, aqueles que conhecem todas as regras, não experimentam alegria pelos olhos novos do cego porque lhes interessa a lei, e não a felicidade do homem: milagres ao sábado, nunca! Não compreendem que Deus prefere a felicidade dos seus filhos à fidelidade à lei, que fala a linguagem da alegria e por isso continua a seduzir. Funcionários das regras e analfabetos do coração. 

Colocam Deus contra o homem, e é o pior que pode acontecer à nossa fé. Dizem: «Os pobres continuam infelizmente pobres, os mendigos continuam a mendigar, os cegos que fiquem satisfeitos, desde que se observe o sábado. Glória de Deus é o preceito observado». Mas na verdade, não: glória de Deus é um homem que torna a ver. E o seu olhar luminoso presta louvor a Deus mais do que todos os sábados! 

E é uma dura lição: os fariseus mostram que se pode ser crente sem se ser bom; que se pode ser homem de Igreja e não ter piedade; é possível “trabalhar” em nome de Deus e ir contra Deus. Administradores do sagrado e analfabetos do coração. 

Nas palavras dos fariseus, a palavra que ocorre com mais frequência é «pecado»: «Sabemos que és pecador; nasceste no pecado; se alguém é pecador, não pode fazer estas coisas»; até os discípulos perguntaram: «Quem pecou? Ele ou os seus pais?». O pecado é elevado a teoria que explica o mundo, que interpreta o homem e Deus. 

A resposta de Jesus é outra: «Nem ele pecou nem os seus pais». Distancia-se de imediato, com a primeira palavra, desta perspetiva, para declarar como ela causa a cegueira sobre Deus e sobre os homens. Falará unicamente do pecado para dizer que está perdoado. 

O pecado não explica Deus. Deus é compaixão, futuro, aproximação ardente, mão viva que toca o coração e o abre, amor que faz nascer e repartir a vida, que traz luz. E o teu coração te dirá que foste feito para a luz. 


P. Enzo Bianchi (IV Dom. Quaresma 2014)
Secretariado Nacional Pastoral da Cultura

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